domingo, 7 de setembro de 2014

Tudo Começou Em Chicago: Cap 5 - O Reencontro

Paul está parado, com os braços suspensos em volta do corpo, usa uma calça de pano que parecia mais um pijama, uma camiseta com a marca da banda "The Tigers", seu cabelo está comprido, chegando no ombro, mas continua loiro, e ele usa anéis em todos os dedos.
-Você estava aí durante toda a música? - Pergunto, sinto meu coração disparar, a cabeça girar, o estômago doer.
-Não... cheguei na metade. Vim correndo quando soube que você estava aqui. - Ele esfrega as mãos na calça, fico lhe encarando. - Desculpe-me, estou muito nervoso... - Se explica ao perceber meu olhar nas suas mãos. Confirmo com a cabeça. -Kate... ver você aqui... me trás esperanças... esperanças de que você pode vir a me perdoar. Estou certo? 
-Não. 
-Kate...
-Paul... Só vim aqui, para dizer que você nunca mais deve me procurar. Nunca, entendeu? - Vejo Paul arregalar os olhos.
-O que? Kate não seja precipitada. Você nem escutou o que tenho para dizer. 
-Exatamente. Eu não preciso escutar o que você tem para me dizer, a resposta será sempre a mesma. Não devemos perder tempo, Paul. 
-Pare de me chamar assim, como se eu fosse um desconhecido. 
-Mas é isso que você é, um completo desconhecido. Nada mudou Paul. - Sinto meu olhos se encherem de lágrimas.
-Já chega Kate...
-Chega? Você não ouviu nem um terço do que tenho para te dizer! - Começo a falar mais alto, e quando termino a frase percebo que estou gritando.
-Kate... 
-Você me deixou Paul! Me deixou, pra seguir seu sonho! Me abandonou durante oito anos! Nunca deu noticias, ou tentou falar comigo! E por tudo isso, eu te odeio! - Estou gritando tanto, que sinto minha garganta queimar.
-Já chega, Kate! - Paul da um grito mais forte, preenchendo todo o salão, e me dando um susto. Paro de gritar, o encaro com o rosto molhado. -Já chega tá? - Diminui a voz, agora é só um sussurro. -Eu já estou consciente de tudo que fiz no passado, da marca que deixei em você... eu já sei... 
Paul começa a chorar, o que me deixa sem reação. Ele cobre o rosto com as mãos.
-Eu sofri todos esses longos anos, por não poder falar com você, tocar você, te ensinar... Kate, você é a minha filha, o bem mais precioso que eu tenho. Não me deixe... - Fico lhe olhando, quero falar, mas não tenho voz.
-Por favor, me escute. Posso lhe explicar tudo... - Ele me olha, esperando minha autorização. Confirmo com a cabeça. -Ótimo, vamos nos sentar. - Paul pega um banco e leva para perto de mim, e eu me sento no banco do piano. Nunca estive tão nervosa, minhas pernas não param de mexer, e a vontade de vomitar só aumenta.
-Eu andava muito desanimado, depressivo até. Meu sonho sempre foi fazer música, e viver uma vida de astro. Me vi arrodeado de coisas que a principio, eu não desejava. 
-Como filhos, uma esposa... Família. 
-Basicamente isso. Digo, não que eu não os amasse, mas não via graça naquilo. Me sentia preso. As únicas horas felizes, eram quando eu lhe dava aulas de violão, guitarra e piano. Conseguia enxergar em você o que um dia já fui, feliz. 
-Você não parecia ser uma pessoa infeliz, estava sempre sorrindo, brincando, tocando violão. Nunca tinha te visto brigar com a mamãe. -Tento olhar nos olhos do Paul, mas ele está encarando o chão. Escuto ele sorrindo, um sorriso roco.
-As aparências enganam... Eu amava a sua mãe, mas ela não entendia que eu precisa tentar, se recusou a vir comigo para Europa. Você acha que foi fácil deixa-la assim? Vê-la chorando daquele modo? Passei a noite anterior acordado, vendo-a dormi, vendo sua respiração, sentindo seu cheiro, não tê-la mais era muito assustador para mim. Então caminhei até seu quarto, Kate... Você era tão pequena... estava perdida no meio de tantos bichos de pelúcia, fui até você e lhe dei um beijo, um beijo de despedida. Me doeu ter que te deixar, doeu tanto que eu pensei que iria morrer. -Paul para de falar, prende a respiração por um tempo, depois solta o ar, e volta a falar. - Quando cheguei no quarto do seu irmão, ele dormia descoberto, estava todo jogado na cama, então o cobri, e lhe dei um beijo... Kate, nada foi tão difícil quando ter que deixar vocês... nada. Não tem um segundo que eu não pare para pensar, como seria minha vida se eu tivesse ficado. Provavelmente não carregaria tanta culpa, seria menos amarga... 
-Pai... -Falo tão baixo que quase não se ouve. Paul me olha com os olhos arregalados.
-Do que você me chamou? 
-De pai. 
-Kate... - Ele me abraça, e começa a chorar, me deixando completamente sem reação. - Não sabe o quanto esperei para escultar você me chamar de pai novamente. - Fala entre soluços.
-Isso não muda muita coisa. -  Tento me soltar dos seus braços. - Aquela feria não se cicatrizou, ainda sinto vontade de vomitar toda vez que olho para você... Te chamar de pai, é a única coisa que consigo fazer por enquanto.
-Sim, eu sei. Não vou lhe cobrar nada. - Diz limpando o rosto. - Mas pra mim, já é um enorme passo ouvir sua voz ao dizer pai. Um triunfo e tanto. 

                                                                            ** 

Ficamos conversando por algum tempo, papai está contando como foi toda a trajetória da banda, como foi difícil chegar onde estão agora. Depois entramos no assunto dos meus estudos.
-O que? Você está cursando Letras? Mas e Música? - Paul me olha incrédulo.
- Bem... Estava fora de cogitação fazer música... 
-Por que? 
Fico vermelha, e um pouco irritada. Como ele não sabe a resposta? Meu estômago doe.
-Ora, você nos deixou. Eu simplesmente, não conseguia voltar a tocar qualquer que fosse o instrumento, tudo me lembrava você e se tornava uma tortura. Mamãe até tentou me colocar com um novo professor, fiz terapia, mas... não dava, era simples assim... não dava. - Olho para o chão, mas percebo que Paul está me encarando.
-Sinto muito, Kate... Não imaginava que ir embora, fosse causar tantos danos... 
-Hum.. -Não conseguia dizer mais nada. Meu estômago não estava contribuindo.
-Tive uma ideia! - Paul fala levando do banco. - Vou começar a te dar aulas, de guitarra e piano. Assim quem sabe, ano que vem você possa tentar cursar Música, em Nova York, na Universidade Juilliard. O que acha? - Ele me olha esperançoso. Levo um susto com tamanha ideia.
-Como é? Na Juilliard? Não vou consegui passar lá. E outra, voltar a ter aulas com você? Acho que não dá... É muito repentino. E você tem que voltar pra França.
-Já está na hora da banda tirar umas férias. Eu ficaria em Chicago te ensinado, depois você treinaria só, e quando eu puder, venho ver como está o treinamento... Vai ser fácil, você toca maravilhosamente. Me deixe fazer algo por você, Kate... Preciso me redimir... Letras não é pra você. 
Não sei o que responder, é muita coisa pra pensar. Desistir de Letras, voltar a ter aulas com meu pai, a possibilidade da Juilliard. Acho que vou surtar.
-Ok... - Sai da minha boca sem que eu consiga segurar. Paul abre um sorriso, pega o celular e disca um número.
-Amos. Vamos tirar férias. 

                                                                          **

Paul me deixa em frente ao prédio, marcamos de amanhã de tarde nos encontrarmos. Quando entro no apartamento, dou de cara com Laura na cozinha, fazendo macarronada, e é então que paraliso, Abel está sentado de frente ao balcão sorrindo. Fico parada, e eles olham para mim como se eu fosse uma assombração.
-Kate! - Laura grita, e sai correndo para me abraçar. - Me conta como foi com o seu pai? - Olho para Abel por cima dos ombros de L. Ele está prestando atenção a cada movimento que faço.
- Oi Kate... - Fala, e percebo seu sorriso forçado.
-Ah é! Encontrei o Abel na rua... ele veio me pedir desculpa pelo mal entendido da festa... nós dois estávamos bêbados... - Laura responde envergonhada.
-Mal entendido? - Pergunto seca. Me sinto irritada só de olhar para ele. - Como beijar outra pessoa, pode ser um mal entendido? 
-Ah Kate, deixa disso... Tá tudo bem, era só uma festa. - Laura parece nervosa.
- Você tem razão... Por isso vim me desculpar, não devia ter feito o que fiz. - Abel parece desanimado. - Acho que já tá na minha hora. Não quero causar confusão, sei que você não gosta de mim Kate, procurarei ficar longe. - Diz ao mesmo tempo que se levanta da mesa.
-O que? Já vai? Não Abel, fique. A Kate não te odeia, foi só um mal entendido. - Responde L as pressas. Então olha para mim, com suplicas no olhar.
Solto um suspiro. - É Abel, não seja tolo. Não deve ir embora só porque te odeio. 
-Kate! - Laura me repreende irritada.
-Ok, desculpa. - Olho para Abel, que me lança um olhar cabisbaixo. - Fique, tá? Só fique. 
Abel muda de humor da hora, é tão rápido que até me assusta. Ele volta a abrir aquele sorriso de ponta a ponta, me tirando o folego.
- Já que insiste, tenho o maior prazer de ficar. 

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